Um silêncio profundo na noite fria, reina absoluto no povoado de Serrinha.

Corujas sobrevoam as torres da igreja localizada na praça peque nina sem calçamento e pouca iluminação!

O coreto construído em ferro fundido nas últimas décadas do século XIX, trepadeiras enrolam-se por entre as grades e treliças, dando um efeito muito bonito àquele belíssimo monumento.

Bandinhas, levam ao público um repertório de músicas que encanta a todos. Nas noites de sábados, é a seresta que invade o silêncio da noite enluarada! Um velho violão acompanha os cantores que levam seu recado de amor às mocinhas de tranças e laços de fitas.

São a esperança das moças que ainda aspiram um  casamento, as chamadas “titias” que não encontraram um amor, quando ainda jovens.

Na pequenina cidade interiorana, havia pouca movimentação social pela falta de opções e estilo de vida pacata dos cidadãos.

O clube local servia aos adultos e idosos que nele passavam horas até o entardecer ou no carteado até o amanhecer!

Nos finais de semana era o bocha disputado como um lazer por descendentes de italianos ou outros de origem européia.

Aos rapazes restavam as partidas de futebol no campinho improvisado, tendo na torcida as garotas com quem flertavam ou namoravam.

Prática comum para as mocinhas nas manhãs dominicais era irem à Igreja cobrindo seus longos cabelos com um fino véu branco todo rendado ou de filó.

No interior do Templo mulheres ocupavam bancos da direita e os homens, da esquerda.

No decorrer do culto religioso, os olhares furtivamente eram endereçados para o lado oposto. Um sorriso tímido fazia as faces ruborizarem, se um olhar furtivo, fosse flagrado.

Silêncio total... penas os sussurros do padre em seu linguajar que rezava a missa em Latim, cujas palavras poucos conheciam a tradução!

Os cânticos à Virgem Maria eram por todos, entoados. Um eco profundo ouvia-se, levando à meditação naquele santuário com arcos e abóbadas pintadas com anjos rosados e  bochechudos, santos musculosos e santas em vestes vaporosas e  primaveris.

Terminada a missa, crianças saltitantes corriam para o centro da pracinha onde um pequeno carrossel as esperava! Outras dirigiam-se para o coreto, subindo no parapeito do gradil ou saltando entre as colunas, rolando na grama verde e fofinha do chão!

Os homens tratavam de por a conversa em dia, relatando as novidades que escutavam no radio de válvulas ou liam no jornal que lhes chegavam às mãos atrasados e que serviam de embrulhos para as compras do armazém! Fumando seus cigarros de palha com fumo de Goiás ou cachimbos recheados por aqueles vindos da Inglaterra em finas latas de metal!

Estes senhores, ligados à terra, mantinham esperanças numa safra promissora do milho, arroz, trigo, batata e frutas da estação!

Comentários e críticas eram constantes quando um agricultor levantava o desleixo governamental em relação ao produtor como dizia seu Jacó: ─ Onde vai o governo buscar alimentos para a população se abandonamos o campo?

Aquelas mãos rudes, grosseiras e com calos, testemunhavam um trabalho insano junto a pás, enxadas e arados movidos a tração animal.

Para o sustento familiar, uma pequena criação de porcos e galinhas existia próxima a casa principal.

No paiol coberto de telhas de barro, sacrificavam-se os animais para armazenar banha e carne em latas, abertas quando da entressafra. Geladeiras nem se ousava pensar, eram todas importadas!

Quando desse trabalho, alguns vizinhos colaboravam e isso era recíproco. Metros e metros de lingüiça bem temperadinha ficavam penduradas em um varal e ao final do dia cada qual recebia um quinhão de carne e lingüiças ou chouriços, sempre elogiados pelo sabor.

À tarde, hora do cafezinho cheiroso, os vizinhos esperavam com ansiedade as broas de centeio ou pães de trigo quentinhos, assados no forno a lenha do quintal.

Uma pasta com toucinho torrado e moído, banha e cheiros verdes, complementava o sabor das grossas fatias que a vovó cortava tão bem junto ao peito!

Bolos de fubá e rosquinhas de polvilho salpicadas de açúcar eram uma tentação, trazidas por uma moça toda faceira!

As crianças, ficaram tristes e penalizadas pois alguns dos bichinhos com quem brincavam no quintal, eram sacrificados para servirem de alimentos, principalmente os patos, marrecos, frangos, e até cabritos e carneiros.

As expectativas das moças resumia-se em casar e ter filhos. Para isso eram preparadas desde pequeninas e tornavam-se prendadas bordadeiras, costureiras, cozinheiras e depois... mães!

A tia que passou dos vinte anos, era sempre motivo de gozação uma vez que ao arranjar um namorado, logo implicava com o pretendente. Se as sobrinhas brincavam que jamais casaria por ser exigente demais, lá vinha uma bronca! Mas nunca deixou passar um dia de Santo Antonio sem fazer diversas simpatias na bacia de água, no prato com velas ou da papeleta com vários nomes de rapazes!

Era assim na vida das cidades pequenas do interior cuja colonização era européia, com uma formação mais rígida



Leia a 2ª parte dessa história

Segunda parte

 

 


 


 

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Fale com a autora:  lyzcorrea@hotmail.com


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